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"Amando o próximo como a si mesmo"

Foto: Gonzaga Soares
Por John Piper

[Jesus] ordena: "Assim como você ama a Si mesmo, ame o seu próximo". O que quer dizer: assim como você anseia por comida quando está com fome, anseie por alimentar seu próximo quando ele está com fome. Assim como você anseia por roupas bonitas para si, anseie por roupas bonitas para o seu próximo. Assim como você deseja ter um lugar confortável para viver, deseje um lugar confortável para o seu próximo viver. Assim como você procura estar seguro e protegido de calamidades e violência, procure consolo e segurança para o seu próximo. Assim como você quer que sua vida faça diferença positiva, deseje o mesmo sentido de vida para o seu próximo. Assim como você se esforça para tirar boas notas, ajude seu próximo para que ele também tire boas notas. Assim como você gosta de ser bem recebido em ambientes novos, receba bem um estranho no meio em que você está. O que você gostaria que as pessoas fizessem a você, faça-o a elas.

Em outras palavras, faça da medida com que busca a sua realização própria a medida com que se dá aos outros. A expressão "assim como" é muito radical: "Ame o seu próximo assim como você ama a Si mesmo", "Assim como!" Isso significa: Se você está empenhado em buscar sua própria felicidade, empenhe-se para que seu próximo também seja feliz. Se você é criativo na busca da sua felicidade, seja criativo na busca da felicidade do seu próximo. Se você é perseverante na busca da sua felicidade, seja perseverante na busca da felicidade do seu próximo. Em outras palavras, Jesus não está apenas dizendo: Busque para o seu próprio as mesmas coisas que você busca para si, mas: Busque-as da mesma maneira — com o mesmo empenho, energia, criatividade e perseverança. Faça da medida com que busca a sua realização a medida com que se dá aos outros. Meça sua busca da felicidade dos outros pela busca da sua própria. Como você busca seu próprio bem-estar? Busque assim também o bem-estar do seu próximo.

Amar os outros em vez de amar a Si mesmo?

Isto é muito ameaçador. Sentimos imediatamente que, se levamos Jesus a sério, teremos de amar os outros não apenas "como amamos a nós mesmos", mas teremos de amá-los "em vez de amar a nós mesmos". Temo que, se eu seguir a Jesus nisso, realmente dedicando-me à busca da felicidade dos outros, meu próprio desejo de felicidade ficará em segundo plano. A demanda do meu tempo, empenho e criatividade pelo próximo terá a preferência de qualquer tempo, energia e criatividade que eu tiver para buscar a minha própria felicidade. Portanto, o mandamento de amar meu próximo como amo a mim mesmo no fundo parece ser uma ameaça ao meu amor a mim mesmo. Como isso é possível? Se há inato em nós o desejo natural da nossa própria felicidade, e se isso em Si mesmo não é mau mas bom, como podemos abrir mão disso para buscar a felicidade dos outros às custas da nossa própria?

O primeiro mandamento salva o segundo

Creio que é exatamente essa ameaça que Jesus quer que sintamos, até entendermos que por isso — exatamente por isso— o primeiro mandamento é o primeiro mandamento. É o primeiro mandamento que faz com que o segundo seja praticável e tira a ameaça de que o segundo mandamento significa o suicídio da nossa própria felicidade. O primeiro mandamento é: "Ame o Senhor seu Deus com todo o coração, com toda a alma, com todas as forças e com toda a inteligência" (Lc 10.27). O primeiro mandamento é a base do segundo. O segundo é uma expressão visível do primeiro. Isso significa que: antes de você tornar sua busca de Si mesmo a medida da sua doação de Si mesmo, torne Deus o alvo da sua busca de Si mesmo. Isto é o que ensina o primeiro mandamento.

"Ame a Deus com todo o coração" significa: Encontre em Deus uma satisfação tal que ela enche todo o seu coração. "Ame a Deus com toda a alma" significa: Encontre em Deus um significado tão rico e profundo que ele preenche todos os cantos angustiados da sua alma. "Ame a Deus com todas as forças" significa: Não poupe esforço ou empenho para pôr-se em posição de ver toda a graça de Deus, que nos satisfaz plenamente, derramada sobre você e através de você. "Ame a Deus com toda a inteligência" significa: Encontre em Deus as riquezas de conhecimento, percepção e sabedoria que guiam e suprem tudo para o que a mente humana foi criada.

Em outras palavras, tome todo o seu amor a Si mesmo — todo o seu anseio, esperança, amor, segurança, realização e significado— tome tudo isso e dirija-o para Deus, até que ele satisfaça seu coração, alma e mente. Isso não implica cancelar o amor a Si mesmo. Essa é a realização do amor a Si mesmo. Amor a Si mesmo é o desejo por vida e satisfação, em vez de frustração e morte. Deus diz: Venha a mim, e eu lhe darei alegria plena (cf Sl 16.11). Satisfarei seu coração, alma, força e mente com minha glória. Este é o primeiro e grande mandamento.

O amor a Deus torna-se a forma do nosso amor pelos outros

Com essa grande descoberta — que Deus é a fonte inesgotável da nossa alegria— a maneira em que amamos os outros é mudada para sempre. Agora, quando Jesus diz: "Ame o seu próximo como a Si mesmo", não respondemos: "Oh, isso me amedronta. Meu amor a mim mesmo é impossibilitado pelas exigências do meu próximo. Jamais poderei fazer isso". Em vez disso, dizemos: "Oh sim, eu amo a mim mesmo. Anseio por alegria, satisfação, realização, significado e segurança. Mas Deus me chamou — na verdade, ordenou-me— para vir primeiro a ele para buscar todas essas coisas. Ele ordena que meu amor por ele seja a forma do meu amor por mim. Que todos os meus anseios por mim encontro nele. Isso é o que o meu amor a mim mesmo é agora. É meu amor a Deus. Eles se tornaram um. Minha busca por felicidade é agora nada mais que minha busca por Deus. E ele tem sido achado".

Então, o que Jesus está ordenando no segundo mandamento — que amemos nosso próximo como a nós mesmos? Ele está mandando que nosso amor a nós mesmos, que agora descobriu sua realização no amor a Deus, seja a medida e o conteúdo do nosso amor ao próximo. Ou, colocando de outra forma, ele está mandando que nossa busca inata de nós mesmos, que agora foi redirecionada em busca de Deus, transborde e se expanda em direção ao nosso próximo. Por exemplo:

Se você anseia por ver mais da abundância e liberalidade no suprimento de comida, casa e vestimenta, procure mostrar a outros a grandeza dessa abundância divina pela generosidade que você encontrou nele. Deixe-a realização do seu próprio amor a Si mesmo no amor a Deus transbordar em amor ao próximo. Ou, melhor, procure fazer com que Deus, que é a realização do seu amor a Si mesmo, transborde por meio de você e se torne a realização do amor do seu próximo a Si mesmo.

Se você quer experimentar mais da compaixão de Deus no consolo que ele lhe dá quando você está triste, procure mostrar a outros mais da compaixão de Deus, pelo consolo que você lhes estende quando eles estão tristes.

Se você anela por saborear mais da sabedoria de Deus nos conselhos que lhe dá quando seus relacionamentos estão sob tensão, procure passar mais da sabedoria de Deus a outros nos relacionamentos tensos deles.

Se você se compraz em ver a bondade de Deus em momentos relaxados de lazer, proporcione essa bondade a outros ajudando-os a ter lazer.

Se você quer ver mais da graça salvadora manifesta poderosamente em sua vida, estenda essa graça à vida dos outros que carecem de graça salvadora.

Se você se regozija nas riquezas da amizade pessoal de Deus em circunstâncias boas ou ruins, estenda essa amizade aos solitários, em qualquer circunstância.

Sempre haverá perplexidade

Não estou querendo dizer que isso responde a todas as nossas indagações sobre o amor, ou que afasta todo tipo de ameaça quando amamos nosso próximo. Há sempre momentos de perplexidade na vida de amor. Há demandas que competem por nosso tempo limitado. Há escolhas difíceis quanto ao que abrir mão e ao que conservar. Há interpretações diferentes do que é bom para a outra pessoa. Não estou dizendo aqui que tudo isso se torna simples.

O que quero dizer é isso: amar a Deus nos sustenta em toda a alegria, dor, perplexidade e incerteza do que amar o nosso próximo deve ser. Quando o sacrifício é grande, lembramos que sua graça nos basta. Quando somos distraídos pelo mundo e nosso coração cede espaço temporariamente ao egoísmo, lembramos que somente Deus pode nos satisfazer, arrependemo-nos e amamos sua graça ainda mais.

Um mundo de alegria em Deus em expansão

Esse é um mandamento muito radical. Ele corta a raiz do pecado, que se chama orgulho. Lembre-se, essa raiz de orgulho que dá origem a todos os outros pecados, essa ânsia de ser feliz, é contaminada e corrompida por duas coisas: 1) a indisposição de ver Deus como a única fonte de alegria verdadeira e douradoura, e 2) a indisposição de ver que Deus quer que outras pessoas recebam de nós a alegria nele. Mas é exatamente essa contaminação e corrupção que Jesus combate nesses dois mandamentos.

No primeiro mandamento ele concentra a ânsia de ser feliz firmemente em Deus e apenas nele. No segundo mandamento ele abre todo um mundo de alegria em Deus em expansão, e diz: As pessoas, os seres humanos, onde quer que você os encontre, foram designados para receber alegria em Deus de você. Ame-os do modo que você ama a Si mesmo. Mostre-lhes, dê-lhes por qualquer meio pratico disponível o que você encontrou para você mesmo em Deus.


Fonte: Amando ao Próximo

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